Haruki Murakami: A Memória É Uma Coisa Estranha
Passaram-se já dezoito anos e, mesmo assim, consigo relembrar ainda cada um dos pormenores desse dia no prado. As montanhas, lavadas da poeira do Verão durante dias de uma chuva suave, ostentavam um verde carregado e brilhante. A brisa do Outono fazia baloiçar as frondes brancas das ervas altas. A comprida faixa de uma nuvem pairava ao longo de uma cúpula de intenso azul. (…) A memória é uma coisa estranha. Quando me encontrava naquele cenário, quase não lhe prestava atenção. Nunca me dei ao trabalho de pensar naquilo como algo que provocaria uma impressão duradoura e seguramente nunca imaginei que, dezoito anos mais tarde, recordaria isso com tantos pormenores. Nesse dia não prestava a mínima atenção àquele cenário. Pensava em mim próprio. Pensava na bela rapariga que caminhava ao meu lado. Pensava em nós os dois juntos, e depois novamente em mim. Eu estava nessa idade, nessa época da vida em que cada visão, cada sentimento, cada pensamento, me era devolvido como um bumerangue. E, pior ainda, estava apaixonado. Amor com complicações. Aquele cenário era a última coisa que me ocupava a mente. No entanto, agora, esse cenário do prado é a primeira coisa de que me recordo.
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Haruki Murakami, Norwegian Wood
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Haruki Murakami, Norwegian Wood
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