Afonso Cruz: Princípio de Karenina


A pele é uma coisa que fica para sempre, tocamo-nos e depois ela fica o mesmo lençol para toda a eternidade. A pele que se toca com amor fica ferida para sempre. As nossas mãos ficaram juntas uns segundos, séculos, férias, milénios. Ela limpava o pó, eu estava a colocar um livro na estante. Aquele toque episódico poderia ter sido uma luta terrível e épica contra os meus princípios, que ainda considerava sólidos e inexpugnáveis, mas foi apenas um momento de doce tranquilidade. Senti uma felicidade estranha, como se nunca a tivesse experimentado em nenhuma das suas variantes, como se a felicidade fosse um bicho exótico que nunca tinha visto, um animal mitológico.

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